quinta-feira, 13 de agosto de 2009

O Cavaleiro e a Donzela, final

Assim o inverno se passou, sem que o frio os incomodasse, pois aquele amor os aquecia. No entanto, Beleg sabia que a cada dia passado, a primavera estava mais próxima, e com o derretimento da neve seu dever era partir. Seu coração tinha um único dono: Malwen, entretanto esse mesmo coração se ressentia com o dever não cumprido. Ela por outro lado vivia a certeza de seu amor e a felicidade de compartilhar cada momento com Beleg.

E quando de fato a primavera chegou, Beleg decidira o que fazer. Não podia viver como um animal escondido na mata, devia ir até seu rei entregar sua espada e seu cavalo, anunciando para todos que não mais seria um cavaleiro a serviço da coroa. Dessa forma nada iria dever ao mundo ao qual tanto sacrificou, e poderia viver em paz com seu coração e com sua consciência, desfrutando do que sentia por sua donzela até que seu tempo no mundo terminasse.

Não foi nada fácil dizer adeus. Os olhos tristes de Malwen eram duas solitárias lagoas refletindo o luar numa noite de inverno. Em toda sua vida Beleg nunca se sentiu tão fraco, deixá-la exigiu tanto dele que quase não conseguia se manter no cavalo. Apesar do que sentia, Malwen entendera os motivos dele, pois não só se pode amar oferecendo-se por completo e era isso que Beleg pretendia fazer. Ela não aceitara a idéia de ir junto com ele, não queria nem mais visitar aquele mundo violento do qual fugira, quando Beleg voltasse, o mundo no qual vivia agora iria se tornar completo.

Assim Beleg partiu montado em Daeroch, cavalgando lentamente no começo, sentindo ainda o peso em seu coração de deixá-la mesmo que brevemente. E Malwen buscou consolo mais uma vez em seu mundo, ela sempre amara aquela floresta e a primavera não era uma época para sofrimento, se deixou levar pela promessa de esperança que a floresta trazia e assim apaziguou seu espírito.

Os dias se passaram, e com a chegada do verão, com sua luz forte e calor inquietante, Malwen se viu transtornada com a demora de Beleg. Meses haviam se passado e ele não retornara, ela não sabia o que fazer. Até que um dia caminhou para o norte, se distanciando da estrada em busca das frutas que cresciam em uma colina a poucos quilômetros da cabana. Queria ir lá não só para buscar alimento, pois tinha medo dos ursos que habitavam ali perto, nesse lugar podia se ver boa parte da estrada, dessa maneira quem sabe poderia ver seu cavaleiro retornando para ela. Esperança boba, ela sabia, mas era a esperança de uma mulher apaixonada.

Não vira nem sinal de ursos por perto, pôde assim chegar ao topo da colina sem problemas. Com o céu aberto, o sol ofuscou um pouco sua visão lá do alto ao olhar para o oeste, pois já passava do meio-dia, mas aos poucos foi divisando a forma da estrada cortando uma pequena parte da floresta. Acompanhou seu trajeto em direção ao leste, foi quando viu fumaça subindo da Grande Clareira. Esse lugar era um imenso espaço na floresta onde só crescia vegetação rasteira. Seu coração se apertou com o que aquilo poderia significar, ela então começou a correr desesperadamente naquela direção, não sentia os cortes em sua perna feitos pelos arbustos que cruzava muito menos a dor do cansaço. Ela só tinha um pensamento na cabeça: Beleg.

Ela correu e correu, só quando a noite chegou ela parou de correr e descansou, dores fortes em seu abdômen a preocuparam. Ao amanhecer ela continuou a viagem, mas dessa vez foi caminhando, alcançou a borda da Grande Clareira antes do meio-dia, o cheiro de carne apodrecendo ao sol embrulhou seu estômago, se entregou ao cansaço e sentou no chão. Enfim as lágrimas de seu desespero correram livres pelo seu rosto, ela se encolheu abraçando as próprias pernas. Ficou lá chorando tentando reunir forças para controlar seu desespero.

Ela não sabia quanto tempo tinha se passado, poderia até sido dias. O transe do seu sofrimento fora por demais pesado, dele ela foi arrancada por uma voz que insistia em falar-lhe, alguém chamava pelo seu nome. Pondo-se de pé rapidamente ela viu um homem montado em um cavalo branco bem a sua frente. “Milady, seu nome é Malwen?” ele disse, “Sim, esse é meu nome cavaleiro, como o senhor o adivinhou?”, respondeu ela. “Beleg me disse, por favor, sem mais perguntas eu lhe peço, Milady me acompanhe e saberá notícias dele”. Então ele desceu do cavalo e a colocou gentilmente montada e a conduziu pelo campo de batalha. Mais ao sul ela pôde ver uma grande tenda armada, era para lá aparentemente que estava sendo guiada.

Ela apeou do cavalo sozinha ao se aproximar, e se deixou guiar para dentro pelo cavaleiro que a encontrara. Depois de esperar alguns instantes foi levada para uma espécie de sala improvisada, ao entrar se atirou ao chão de joelhos, pois o próprio rei daquele país estava lá diante dela sentado em um trono improvisado. O rei fez um gesto para que o cavaleiro os deixasse, se levantou do trono e caminhou até ela. “Milady Malwen”, disse ele suavemente enquanto a ajudava a levantar. “Meu senhor”, foi tudo que ela conseguiu dizer. “Venha sente-se”, disse ele enquanto a conduzia até uma cadeira, “Vou lhe contar o que aconteceu”.

O rei lhe disse que Beleg foi até ele com o intuito de devolver a espada e o título que ele possuía, mas o rei indagou-o pelos seus motivos, Beleg prontamente contou o porquê de não poder mais servi-lo e o que faria dali pra frente. Dessa forma o rei ao saber que Beleg iria fixar residência na Grande Floresta junto com Malwen, se viu obrigado a lhe dizer que um exército invasor se aproximava para tomar a floresta, que era uma grande fonte de água potável, alimentos etc. Beleg então se viu obrigado a defender sua futura casa e seu grande amor daquele mal, assim prontamente acompanhou o rei para a batalha como seu último ato como cavaleiro.

“E nessa longa batalha em defesa do seu lar por direito e pela vida que ele escolhera viver, Beleg morreu”, concluiu o rei. Malwen já sentia isso em seu coração a algum tempo, por isso não ficou surpresa da notícia. “Eu já estava preparando uma patrulha para procurá-la na floresta, pois não podíamos enterrá-lo sem sua presença. Todos aqui já conhecem sua história, já que Beleg se orgulhava muito dela, ele sempre a contava a noite quando todos se sentavam em volta da fogueira, felizmente você nos encontrou a tempo”.

Na manhã seguinte Beleg foi enterrado aos pés da árvore onde Malwen o encontrara, todos os cavaleiros sobreviventes prestaram honras a ele, assim como o rei que antes de partir falou-lhe: “Milady, a armadura, espada e escudo são seus por direito, a única herança de um cavaleiro honrado como ele foi.”, disse o rei com a mão repousada sobre o ombro dela. Ela estava distante perdida nas memórias do inverno que vivera ao lado dele, ela olhava fixamente para a terra que cobria o corpo de Beleg, se aproximou da árvore a tocou e respondeu para o rei: “Não os quero, poucos conheceram Beleg de verdade, e aqueles que podem dizer isso sabem que a única coisa cuja qual ele desejava na vida era poder viver em paz, infelizmente quando encontrou seu lugar no mundo, foi levado pela morte, pois parecia que não era esse seu destino. Meu senhor só lhe digo uma coisa agora, antes de nos despedirmos para sempre, o filho que carrego no ventre não receberá tal herança, vou criá-lo sozinha para que ele possa realizar o sonho do pai de viver em tempos paz e lhe peço, meu senhor, meu rei para ajudar-me a realizar esse sonho. Só assim teremos certeza de que um homem com coração tão bom não morreu em vão”.

O rei olhou para o túmulo de Beleg e assentiu com a cabeça àquele pedido que não tinha nada de absurdo, pois aquele era o sonho de todos os homens, e a deixou lá em pé a se despedir enquanto acariciava o seu ventre.

6 comentários:

  1. Parece que esse historia foi escrita no seculo dezoito pela carga emocional e pela formalidade e na riquesa de detalhes
    ah jean so pra dizer que nao venho aqui tá kkk
    se cuida, beijos

    ResponderExcluir
  2. Nossa, como eu ando sem tempo pra entrar no blog, e quando entro nem tenho tempo de responder.
    Seu texto...então, fiquei sem palavras, li as outras partes, e me calei. Digno.

    Beijos

    ResponderExcluir
  3. Você parece um cavaleiro vindo direto do século XVI para nos contar essas incriveis histórias, muito bom e autentico o jeito como vc escreve, parabéns!

    ResponderExcluir
  4. Vc dá pra ser um historiador com certeza...
    acho que muita gente ia passar a gostar de história.. rsrs
    ;D

    ResponderExcluir
  5. tem uma brincadeira no meu blog pra vc.

    beijos

    ResponderExcluir
  6. Já perdi a conta de quantas vezes li esse conto!!! E sempre tenho a mesma reação com cada palavra lida!!!

    Parabéns...

    Bjo

    ResponderExcluir